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Como os Mecanismos de Precificação do Carbono podem ajudar a Impulsionar a indústria de H2V no Brasil

O mercado de carbono tem avançado no mundo, ainda que a passos mais lentos do que o necessário para reverter os efeitos do aquecimento global. Segundo o grupo de estudos Gesel, da Universidade Federal do Rio de Janeiro, já existem 159 projetos registrados no Brasil, dentro do mercado voluntário de créditos de carbono. A maioria deles na área de energia. No Brasil, os avanços na legislação concernente ao mercado regulado são recentes e o mercado voluntário ainda é considerado pequeno. No entanto, o potencial é enorme. Confira na entrevista realizada com os pesquisadores da Universidade Federal do Rio de Janeiro: Thereza de Aquino, Ana Carolina Chaves e Igor Julião.

1) Por que é importante precificar o carbono e quais têm sido as principais regras que têm regido este mercado?

Segundo dados da 6ª Estimativas Anuais de Emissões de Gases de Efeito Estufa no Brasil, em 2020, o setor de Energia correspondeu a 23,2% das 1.675,76 milhões de toneladas de CO2eq emitidas no ano. Assim como pontuado na Nota Técnica EPE/DEA/GAB/014/2020 sobre Precificação de Carbono, essas emissões do setor de energia, e dos demais setores, afetam os padrões de precipitação, regimes hídricos e eólicos, entre outros, o que acarreta incertezas e custos à geração de energia.

Em outros termos, essas externalidades provenientes de diferentes atividades acarretam a distorção dos sistemas de preços, e, portanto, se faz necessária a precificação destas externalidades, atribuindo valor e incorporando estes aos custos de produção dos respectivos responsáveis para corrigir essa ineficiência de alocação econômica (EPE 2020).

Os principais mecanismos de precificação adotados atualmente são a Tributação de Emissões (ou no inglês, Carbon Tax) e os Sistemas de Comércio de Emissões (ou no inglês, Emissions Trading Systems, ETS). Os ETS se baseiam na construção de um sistema que permite a troca de unidades de emissão pelos agentes envolvidos para atingir um resultado eficiente. Esses sistemas funcionam de duas maneiras: Cap-and-trade, onde é definido um limite de emissões e são distribuídas licenças gratuitamente ou através de leilões; e Baseline-and-credit, onde são definidos uma base de emissões, e, emissões abaixo dessa base geram créditos que podem ser vendidos para agentes que excedem o limite. Por sua vez, a taxação do carbono consiste na definição de um valor às emissões, como por exemplo, a precificação da tonelada de CO2eq, se diferenciando dos sistemas por definir o preço das emissões e não um limite para tal (EPE 2020; Carvalho, Magalhães, and Domingues 2022; World Bank 2023).

2) No Brasil, quais os principais avanços que temos tido nos âmbitos público e privado, dentro do mercado de carbono?

Atualmente o Brasil já apresenta uma regra de precificação. Esta primeira iniciativa pública de precificação de carbono foi criada pela Lei n° 3.576/2017, onde se estabeleceu a Política Nacional de Biocombustíveis (RenovaBio) e foram criados os CBIOs, créditos de descarbonização, equivalentes a 1 tonelada de CO2 e passíveis de comercialização (EPE 2020). Os CBIOs são transacionados entre Produtores de biocombustíveis – etanol e biodiesel – que emitem créditos de descarbonização (CBIOs) que remuneram a eficiência energética e ambiental da produção por tonelada de carbono que deixou de ser emitida, e as Distribuidoras de combustíveis que têm metas anuais obrigatórias de descarbonização, que são cumpridas com a aquisição dos títulos negociados na bolsa de valores B3.

Entretanto, existem atualmente alguns projetos de lei sendo apreciados pelo Congresso com propostas para a criação de um mercado regulado de carbono com base em ETS. Um dos consensos é o reconhecimento do ETS de caráter mandatório como ponto central dos instrumentos de mercado para incentivar uma mudança para economia de baixo carbono. Isso significa que, para um conjunto de entes regulados, no caso a indústria, será definido um limite de emissões periodicamente.

Por sua vez, em relação ao mercado voluntário, o Brasil apresenta uma posição ainda reduzida na geração de créditos de carbono, e atualmente apresenta uma grande evolução deste mercado, como apresenta a figura 1 abaixo:

Fonte: Vargas et.al. 2022

Segundo o levantamento apresentando no relatório publicado em 2022 pela FGV EESP, “Mercado de Carbono Voluntário no Brasil: Na realidade e na prática”, o mercado voluntário brasileiro conta com 159 projetos registrados, sendo estes majoritariamente projetos de Energia (63%), seguidos por projetos sobre Agricultura, Florestas e Outros (25%). Os autores apontam que o grande crescimento do mercado voluntário nos anos recentes é devido ao crescente interesse do setor empresarial em neutralizar suas emissões, assim como o fim em 2021 do período de cumprimento de compromissos assumidos no Tratado de Quioto (Vargas, Delazeri, and Ferreira 2022).

Como reflexo desse interesse do setor privado, a Verras, organização sem fins lucrativos que estabelece padrões para os créditos de carbono do mercado voluntário com maior participação no mercado brasileiro (Vargas, Delazeri, and Ferreira 2022), anunciou esse ano a criação de um escritório no Brasil (Bittencourt 2023). Tal iniciativa tem potencial para acelerar o processo de geração de créditos e certificação de projetos, e é indispensável para o Brasil superar as barreiras que enfrenta na expansão do mercado voluntário. (Bittencourt 2023; Verras 2023).

Considerando apenas os atuais compromissos das empresas mapeadas, a demanda por crédito de carbono voluntário no Brasil deve chegar a 7 milhões de toneladas de CO2eq em 2030, o que representaria aproximadamente USD 200 milhões. Porém, conforme novos compromissos são anunciados, a demanda total pode chegar a 90-220 milhões de toneladas de CO2eq de acordo com o estudo realizado, o que, dentro dos diferentes cenários de oferta e preço, pode representar um mercado de USD $1,5 a 6 bilhões. (Mckinsey,2022)

3) Como o hidrogênio verde deve se beneficiar do mercado de carbono nas próximas décadas?

O desenvolvimento de uma indústria de H2 no Brasil ainda precisa enfrentar algumas barreiras, principalmente na produção, transporte e armazenamento do hidrogênio. Atualmente, a reforma de gás natural é o método mais usual para a produção do gás, entretanto, esta, apesar de ser o método mais barato, também produz aproximadamente 10 toneladas de CO2 para cada tonelada de H2 (Delpierre et al. 2021). A via de produção de eletrólise da água, da qual é proveniente o Hidrogênio Verde, apresenta uma via mais “limpa” mas sua aplicação ainda é limitada por questões econômicas, como custo de componentes e/ou gasto energético (Shiva Kumar and Lim 2022).

Além disso, o transporte e armazenamento do gás também apresentam grandes penalidades energéticas, encarecendo a logística do combustível (Staffell et al. 2019; Rath et al. 2019). Neste contexto, a expansão dos mercados de carbono nas próximas décadas aparece como uma oportunidade, uma vez que os ganhos com o mercado serviriam no abatimento de custos de implementação e desenvolvimento das tecnologias necessárias, criando oportunidades econômicas para empresas e governos atingirem objetivos ainda mais ambiciosos que os originalmente determinados em suas Contribuições Nacionais Determinadas – NDCs (Piris-Cabezas, Lubowski, and Leslie 2023).

A atratividade para projetos de H2V com relação ao mercado de carbono baseia-se no potencial de monetização da iniciativa de produzir e consumir um combustível neutro, além de ser possível o uso do mercado de carbono voluntário para transações entre emissor e comprador. Importa destacar a necessidade de metodologias para mensurar a quantidade de CO2 evitadas e a precificação, bem como a importância de auditorias e certificações para validar as emissões.

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